O CINE LEAL

07/07/2023 19:40:11
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Publicado em 18/09/2014

Para se falar a respeito do Cinema Leal, é necessário retroagir no tempo, voltar à época da fundação de nossas bandas musicais.

A Sociedade Musical Beneficente Euterpe Friburguense foi fundada, em 26 de fevereiro de 1863, pelo maestro português Samuel Antônio dos Santos, com a ajuda de amigos das famílias Bravo, Tingly, Sardou, Martignoni, Berçot e outros.

Alguns anos depois, começou a surgir, dentro da monarquista Euterpe, um grupo dissidente de republicanos- Galiano Emílio das Neves, Eduardo Salusse, Eduardo Eugênio de Castro e Antônio de Souza Cardoso – liderado pelo Major Augusto Marques Braga. O referido grupo fundou a Sociedade Musical Beneficente Campesina Friburguense, em 6 de janeiro de 1870 e, na Chácara do Paraíso, se reunia no casarão da família Braga, para os seus ensaios, sob a regência de Presciliano José da Silva, o seu primeiro maestro, formado pelo Conservatório de Música de Milão, Itália.

Tal situação não podia permanecer, a Campesina necessitava de uma sede própria. Foi, então, comprado um terreno na Rua General Câmara (hoje Augusto Spinelli), para a construção da sua sede, onde seriam desenvolvidas não só as artes musicais como as artes cênicas. Seria o Teatro Victor Hugo, cuja pedra fundamental foi lançada em 1886. A construção teve início, o prédio começava a ser erguido, com a ajuda de muitas doações, mas as despesas foram ficando, cada vez, mais vultosas e os trabalhos foram paralisados.

A solução seria vender o imóvel inacabado e, com a quantia obtida, construir uma sede mais modesta. Como que guiado pela providência divina, surgiu o Sr. Manoel Amâncio de Souza Jordão, um rico fazendeiro que, ao realizar a transação comercial, se comprometeu a concluir as obras, retomadas em 1895. Só impôs uma condição, o nome do teatro não seria mais Victor Hugo, mas Teatro Dona Eugênia para homenagear sua esposa. 

Com a venda do teatro, a Banda Campesina adquiriu um terreno, na Rua Jacome (depois chamada de Rua da Campesina, atual Fernando Bizzotto), onde construiu sua sede e, ali permaneceria, até ela ser desapropriada, em 1950, para a continuação da Rua Governador Portela (hoje, Prefeito José Eugênio Muller).

Quanto ao Teatro Dona Eugênia, inaugurado no dia 19 de fevereiro de 1895, levaria belos espetáculos, por cerca de trinta e cinco anos, aos friburguenses. Segundo o engenheiro e pesquisador Nelson Alvarez, “em suas dependências, em 7 de setembro de 1899, aconteceu a primeira apresentação, na cidade, do Cinematógrafo de Édson. A novidade tornou-se atração, fazendo com que durante anos, passasse a alternar sessões de cinema com apresentações teatrais”. Ainda, segundo o citado pesquisador, “ o primeiro concerto do maestro Heitor Villa-Lobos aconteceu no extinto Theatro Dona Eugênia, em 29 de janeiro de1915”.

Por volta de 1930, o Teatro Dona Eugênia foi arrendado ao Sr.Francisco Leal. Ele era dono de um cinema de madeira, em estilo mourisco, no final da praça (no local, a Rodoviária Urbana), desde a década anterior, e ao adquirir o antigo teatro, para ele transferiu o cinema da praça, que foi desativado. Surgia o Cine Teatro Leal que funcionaria por uns quarenta anos. Visando dar-lhe um aspecto mais moderno, anos depois, teve a sua fachada, totalmente, modificada. Felizmente, no seu interior, a sua arquitetura original, que era primorosa, foi preservada e mantidos os seus 17 camarotes.

Com a inauguração do Eldorado, em 1940, o Leal se tornou um cinema mais popular, com ingressos mais baratos, exibindo reprises e filmes mais modestos, porém, contando com um satisfatório número de frequentadores, principalmente, nas matinês de domingo. Grande era a popularidade do seu porteiro “Patola” (José Correia), que residia defronte do cinema, cuja esposa preparava o inigualável amendoim torrado, vendido no Leal.

Com a morte de Francisco Leal, o cinema passou para o seu genro, o Sr. Aristão Pinto, que era o proprietário do moderno, confortável e bem aparelhado Cinema Eldorado. Com o esvaziamento dos cinemas, o Leal teve suas atividades encerradas, ficando em total abandono, sendo demolido em julho de 1975, para dar lugar ao Edifício Prefeito Gustavo Lira. Mais um elo, que nos prendia ao passado, era rompido, causando-nos profunda melancolia.

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