Psicoterapias Corporais – Um caminho alternativo para a Espiritualidade

03/11/2021 18:13:12
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SÉRIE CORPO

Iniciada na década de 20 por Wilhelm Reich, e amplificada por Alexander Lowen na década de 80, a análise do caráter – a partir da unificação das expressões mente e corpo, em sua manifestação de personalidade e comportamento nos sintomas musculares e mobilidade funcional – introduziu o conceito de que as alterações nas atitudes, sentimentos e pensamentos do indivíduo, como resposta às circunstâncias da vida, estão relacionadas e condicionadas a uma mudança no funcionamento do corpo e a uma alteração na vitalidade, e vice-versa. Ou seja, corpo e mente (em seu conjunto emoção-pensamento) se refletem mutuamente de forma constante e indivisível.

Como Psicoterapia Corporal, a bioenergética utiliza o corpo, seus movimentos e expressões, de forma a remover bloqueios energéticos expressos em tensões musculares e sintomas físicos, a fim de promover autoconhecimento, aprimorar as relações interpessoais e intrapessoais, ampliar o bem-estar e a vitalidade, numa melhor dinâmica e interação do indivíduo consigo mesmo, suas experiências, e com a própria vida; restaurando consequentemente a saúde e promovendo o autocuidado.

 A Bioenergética, como prática integrativa de abordagem psicodinâmica, foi introduzida no SUS pela PNPIC em março de 2018, através da Portaria Ministerial nº 702.  Portanto, veio como ampliação às abordagens de cuidado, multiplicando as possibilidades terapêuticas tanto para usuários, como para profissionais de saúde, garantindo assim uma maior integralidade e resolutividade da atenção à saúde, enfatizando um cuidado continuado, humanizado e integral, tanto do ser humano quanto da doença, sob a ótica da prevenção, promoção e recuperação da saúde.

Como prática integrativa, a bioenergética se utiliza de do grounding, e de  exercícios respiratórios e corporais seguros, objetivando a liberação do fluxo natural da energia orgânica, que movimenta e une corpo e psique. Desde seu desenvolvimento até a  atualidade, a  bioenergética registra um histórico de benefícios, estendidos a diferentes grupos de usuários, e aos próprios profissionais da saúde;  e vem registrando inúmeros resultados positivos como a redução do estresse, da insônia e das dores corporais; a ampliação no autocuidado como método preventivo; o autoconhecimento e a consciência corporal; o aumento na vitalidade; a facilitação da expressão emocional; o fortalecimento da autoconfiança, da autoestima, do ânimo e da motivação; além de promover a dilatação da rede social e o estímulo ao convívio harmônico; dentre outros, incluindo-se também o desenvolvimento da espiritualidade em todo os eu contexto de bem-estar e  plenitude existencial.

O Brasil é referência mundial na utilização de práticas integrativas e complementares de atenção básica à saúde. Entretanto, a dificuldade de qualificar profissionais em número adequado para atuarem na rede pública de saúde, a complexidade no monitoramento e avaliação dos serviços e resultados, assim como o pouco investimento, impedem a ampliação do uso das PICS, e consequentemente, dificultam a aplicação, pesquisa e contínuo desenvolvimento da bioenergética como recurso.

Apesar da PNPIC apoiar e dialogar com outras áreas transversais para o desenvolvimento de legislação e normatizações, buscando qualificar serviços, habilitar profissionais e divulgar conhecimento acerca das terapias integrativas, ainda carece de estratégias eficazes no auxílio à superação das dificuldades de inserção dessa forma de cuidado na atenção primária. A “Estratégia da OMS sobre Medicina Tradicional 2014-2023” admite que as PICS são frequentemente subestimadas e desacreditadas, apesar praticadas em muitos os países com excelentes resultados, e apresentarem uma contínua e crescente demanda.  

As novas estratégias devem atentar para ações que retirem essas práticas da marginalidade, e para o incentivo permanente de torná-las presentes em serviços especializados, uma vez que a maior admissão e utilização dessas PICS, por usuários e profissionais, poderão simplificar as ações de saúde, reduzindo a massa populacional adoentada que enxameia os núcleos de saúde pública, em razão de atuar também de forma preventiva; diminuindo consequentemente o uso de medicamentos desnecessários, exames e encaminhamentos que tanto oneram o Sistema Único de Saúde.

A Bioenergética se apresenta ao SUS como uma excelente alternativa, pois baseia-se em recursos terapêuticos não invasivos, não medicamentosos, cujos exames são realizados pelo próprio terapeuta através uma análise minuciosa e acerca do corpo e suas expressões de forma e movimento, referenciadas numa vinculação humanizada e afetiva, cujo tratamento é efetuado por toques terapêuticos, exercícios corporais e respiratórios. Além disso, possui resultados comprovados.

No Brasil, a aplicabilidade da bioenergética tem se expandido para além do âmbito psicoterapêutico, encontrando-se presente no contexto mais amplo da saúde pública e da atenção primária à saúde. Estados e municípios, autorizados a criar e implantar políticas e diretrizes locais em saúde, deveriam socializar os aprendizados obtidos, contribuindo para diminuir o desperdício de tempo com a ausência de registro de informação e compartilhamento dessas experiências na aplicação das PICS.

As práticas integrativas e complementares em saúde, incluindo a Bioenergética, estão em expansão, promovidas sobretudo por ações particulares e instituições não governamentais, mas ainda escassas em serviços médicos e nas instituições públicas de saúde, inclusive na Atenção Primária (APS), devido a um grande problema, que soma o desconhecimento dos profissionais de saúde ao ranço preconceituoso que a corporação médica introjeta em todo conhecimento tradicional que não advém da metodologia acadêmica, lutando agressivamente no Ocidente para se estabelecer como a corporação oficial dos curadores, e depois para manter-se com esse relativo monopólio institucional.

Propiciar que os profissionais de saúde e médicos experimentem essas práticas integrativas já seria bom começo. Superado assim o preconceito, as práticas integrativas e complementares podem e devem interagir, complementar, ou muitas vezes até substituir cuidados convencionais, sobretudo em situações frequentíssimas em que o cuidado convencional é pouco resolutivo, frustrante e/ ou muito iatrogênico.

Várias PICS, incluindo a terapia bioenergética, juntam cuidado clínico com promoção da saúde, e têm a possibilidade de emponderar, de convidar à autonomia e ao desenvolvimento de habilidades e práticas de autocuidado. O aumento na participação dos usuários reduz a dependência do cuidado profissional. Por isso nos interessa vê-las mais amplamente reconhecidas como saberes e práticas de cuidado de si e do outro, dotadas de seus respectivos valores e sabedorias, elaboradas como recursos de melhoria, tanto para os profissionais e usuários, quanto para o alívio da sobrecarga econômica e humana que tanto onera e impede uma maior eficiência do Sistema Único de Saúde em nosso país.

Fontes:

  • http://observapics.fiocruz.br/educar-e-socializar-aprendizados-facilitam-implantacao-das-pics/
  • Bioenergética – Biblioteca Virtual em Saúde MINISTÉRIO DA SAÙDE – https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/praticas_integrativas_saude_bioenergetica_1ed.pdf
  • Lowen, Alexander – Bioenergética, Ed. Summus, 12ª edição,1982.

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